domingo, 17 de outubro de 2010






































A minha vida é hoje 
um sítio de silêncio
                                               ruy belo










Não mais a literatura, os seus
fúteis e imperiosos desígnios
- julgamos dizer, insistindo
numa ourivesaria do terror
e em gestos que sabem o quanto
chegam tarde. Quando sós,
à boleia do crepúsculo, dizemos
coisas assim, mentimos com
os dentes todos que não temos.

E a mentira (a literatura)
é ainda a improvável derrota
de que não nos salvaremos
nunca. Tão igual à vida, portanto:
pouso o copo, recupero o fôlego,
fumo uma silepse. Sei que vou morrer.

E isso que - talvez - nos diz
é uma evidência que escurece
(tivemos por amigo o desconforto).

Quanto ao mais, vamos andando.
Casados ou sozinhos. Mortos.



manuel de freitas





primeiro desceu às árvores, ocupou-lhes a madeira, envelheceu-lhes o casco. mais tarde foi o céu cinzento, os pássaros sem asas. as flores, já não eram flores, secas. depois veio até ao rosto e ali ficou a amortecer a pele. as rugas, o frio. os olhos brancos, tão brancos. e os lábios de um roxo morto, pelo menos assim apareciam à boca quase sempre fechada. era outono. pelas ruas crescia um rumor deserto.





ne me quitte pas.











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