Não sei como vieste, 
mas deve haver um caminho 
para regressar da morte. 
Estás sentada no jardim, 
as mãos no regaço cheias de doçura, 
os olhos pousados nas últimas rosas 
dos grandes e calmos dias de setembro. 
Que música escutas tão atentamente 
que não dás por mim? 
Que bosque, ou rio, ou mar? 
Ou é dentro de ti 
que tudo canta ainda? 
Queria falar contigo, 
dizer-te apenas que estou aqui, 
mas tenho medo, 
medo que toda a música cesse 
e tu não possas mais olhar as rosas. 
Medo de quebrar o fio 
com que teces os dias sem memória. 
Com que palavras 
ou beijos ou lágrimas 
se acordam os mortos sem os ferir, 
sem os trazer a esta espuma negra 
onde corpos e corpos se repetem, 
parcimoniosamente, no meio de sombras? 
Deixa-te estar assim, 
ó cheia de doçura, 
sentada, olhando as rosas, 
e tão alheia 
que nem dás por mim. 
eugénio de andrade
bonjour tristesse
e o teu lugar será o mesmo. de sempre. a mesma casa. o mesmo colo. a minha cara alegre. embora recordar-te seja como abrir os olhos ao vento ou perder os cabelos nas primeiras manhãs de inverno. estou triste. mas poderia não estar se tu estivesses. se por um momento aqui voltasses. e no mesmo lugar de sempre. o sorriso posto na pele. é domingo. decerto lembrar-te-ás que aos domingos faz frio deste lado da varanda. onde bate mais o vento. e o coração. esse pedaço de noite.  bate. tão dentro do corpo ainda te espero como da primeira vez. quando vinhas com os braços murchos. e foram tantas eras a cobrir-te de muros. foram tantas vidas. estou triste. talvez amanhã não choro. não to posso prometer. talvez mais tarde no corpo morto não te recorde. agora não.  
 
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