sexta-feira, 19 de dezembro de 2014







laura makabresku









A minha morte, não ta dou.
De resto, tiveste tudo
- a flor, a sesta, o lusco-fusco,
a inquietação do dia 8,
as órbitas das mães, das mãos,
das curiosas palavras de não dizer nadinha.
Tudo tiveste: estás contente?

Feliz assim por teres tudo o que sou?
Feliz por perderes tudo o que sei?

Só não te dou o que não serei.
Não, a minha morte, não ta dou.
pedro tamen










quando morreste fazia frio mas o céu sem nuvens - a geada entranhada na terra. funda - era a certeza que o tempo parava. e o sino forte na igreja batendo. como murros no peito e estalos na cara - entregaram o teu corpo já passava do meio dia. estavas tão asseada. trazias vestida a camisola cinzenta que tinha embrulhado para te oferecer no natal. como não chegaste ao natal vestiram-ta logo - de véu posto como uma grinalda. preto fundo nos olhos sempre tão azuis. um silêncio enorme instala-se na sala e eu a desaparecer. a desaparecer. a desaparecer           - ao final da tarde afoguei-me. tanta água. tanto sal. tanto mar. e fui como vão os peixes pequenos no mar alto. arrastada pelas águas - madrugada dentro. eu e o teu corpo na sala. cheguei-me a ti e lembro-me de te ter dito: reza comigo avó. e o frio da tua pele a meter-se na minha. e a minha mão de repente na tua - avé maria. cheia de graça           - quando amanheceu. já domingo seria. mas a consciência do tempo não existia. nem eu. e lembro-me de todos os corpos especados à porta de casa. tantas flores. tantas velas. tanto frio. tanta dor. levaram o teu corpo aldeia fora até ao cemitério. o meu corpo tão pesado abraçado à minha tia. minha tia com a força de mil homens a carregar-me avenida fora - não soube da mãe. nem do pai. não vi ninguém. só teu corpo deitado e o meu quase chão - meteram-te na terra faz hoje quatro anos 

















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