terça-feira, 24 de dezembro de 2013






mariam sitchinava








Um dia, quando a minha memória de homem fugitivo
alcançar a idade de um deserto, debruçar-me-ei num poço e
tentarei beber o tempo esquecido do teu rosto. Estarei lucidamente
morto, eu sei, e os meus olhos já não prenderão a adolescência,
nem as imagens que dela se soltaram. E a minha cegueira surgirá
cercada por frondosas árvores e pássaros, mas não os verei mais.
O rosto, o teu rosto, já não conseguirá atrair-me para o fundo
circular do poço.

O tempo de sedução terminou. Terás de me tocar, terás de
trocar o tacto dos olhos pelo tacto dos dedos. Apenas persistirá o
jogo, a cumplicidade, e uma ténue vibração do corpo que se
perdeu contra o meu corpo.

Por isso me ergo daqui e atravesso estas imagens coladas às
paredes, e ao atravessá-las descubro que estou perdido, e
condenado também a perder-te.

Levanto-me do fundo de mim mesmo e abandono a casa, os
bens que herdei, e vou pela memória daqueles vestígios que se me
cravaram no interior das pálpebras, mas não semeio nem recolho
nada. Apenas persigo os passos que outrora abandonei pelas
cidades onde te procurei, antes mesmo de saber que existias.

E perco-me, perco-me onde a sombra dos corpos é um
sudário de melancolia sobre o mar. Mas, ainda aqui estou, quase
vivo, atento ao movimento perene de tuas mãos sobre o meu
corpo. E sem bússola, nómada até aos ossos, sigo pela noite onde

aportei, e não reconheço a casa que me destinaram para morrer.

al berto









minha pele respira a memória do teu corpo - não percebo como fui capaz de perder-te. que caminho se fez vida onde não existes. se algum dia foste ou se ainda és - e sinto-me só. como quando o corpo inteiro procura um lugar onde esconder-se. onde não ser - ninguém saberá de ti. teu nome só existiu na minha boca. nosso mundo foi um sonho e à força do grito o silêncio fez-se noite - esperar-te - no limite o futuro tem-te e serão minhas todas as noites onde te deitas - hoje sei que não estás. não sei porquê. nem entendo assim o tempo de estares longe - talvez um dia. não muito longe. fiques perto para sempre. e o para sempre existe como tu - feliz natal. feliz. para sempre. 









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