sábado, 2 de março de 2013






laura makabresku


 E a tua voz ouço-a agora, vinda de longe, como o som do mar imaginado dentro de um búzio. Vejo-te através da espuma quebrada na areia das praias, num mar de Setembro, com cheiro a algas e a iodo. E de novo acredito que nada do que é importante se perde verdadeiramente. Apenas nos iludimos, julgando ser donos das coisas, dos instantes e dos outros. Comigo caminham todos os mortos que amei, todos os amigos que se afastaram, todos os dias felizes que se apagaram. Não perdi nada, apenas ilusões de que tudo podia ser meu pra sempre.

 miguel sousa tavares







a morte é a falta de alguém que já não existe - existir é deixar partir. para sempre. as pessoas que amamos. fechá-las do lado de fora do corpo. nunca mais pronunciar o seu nome - eu existo para que as pessoas que amei nunca morram e por isso te recordo como se estivesses vida. a saia com a bainha desfeita atrás escondida pelo avental. a camisola de lã muito pura. tirada da ovelha ainda virgem. as mãos fartas de agarrar a vida. o rosto muito branco e frio como a neve na serra - se fechar os olhos ainda aqui estás a abraçar-me muito - abraça-me forte. avó. para que não chore.